"Ó Deus, criaste-nos para Ti e o nosso coração vive inquieto enquanto não repousa em Ti!" (Santo Agostinho)

"Faça poucas coisas, mas as faça bem!" (São Francisco de Assis)

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Os santos e nós

(Santo André - 30 de novembro)
Ganhei este santinho de uma senhora desconhecida em 1991

A comunhão dos santos se expressa numa espiritualidade vivida entre pessoas santas, na qual rezamos com os “de lá”, ao mesmo tempo em que estes se unem a nós no mesmo espírito orante.

A essência fundante e fundamental da Igreja é a comunhão. Comunhão dos que vivem sobre esta terra, sob as marcas condicionantes do tempo e do espaço, comunhão dos que já ultrapassaram os limites deste mundo e gozam da plenitude absoluta junto ao Pai; comunhão de todos os que militam, com todos os que triunfam na feliz eternidade, sob a força unificante de Deus. Nessa perspectiva existencial, a Igreja Católica confessa a comunhão dos santos.

O fato de constituirmos um só corpo, tendo Cristo como cabeça, “o bem de uns é comunicado aos outros; o bem de Cristo é comunicado a todos os membros”; e sendo que a “Igreja é governada por um só e mesmo Espírito, todos os bens que ela recebeu se tornam necessariamente um fundo comum” (CIC – Catecismo da Igreja Católica – 947).

Oração – A comunhão dos santos se expressa numa comunhão vivenciada nas coisas santas e vivida entre pessoas santas. Assim é que se pode entender o sentido de rezar pelos mortos, pois na verdade o que ocorre é um imenso mutirão de oração, no qual os daqui rezam com os “de lá”, ao mesmo tempo em que estes se unem aos de cá no mesmo espírito orante. Portanto, não se reza pela alma de uma pessoa, mas se reza com a pessoa que já se foi. Assim todos estão sintonizados com o coração misericordioso do Senhor, realizamos a amistosa tarefa da intercessão, pedindo uns pelos outros (CIC – 2.635), orando uns com os outros.

Este fato assume formas múltiplas e diversificadas entre as pessoas das comunidades e o povo em geral, pois nem sempre a devoção ao santo expressa uma efetiva eclesialidade. Já ouvi uma senhora evangélica dizer: “Padre, eu sou muito feliz na mina Igreja, o pastor é muito bom comigo, me dá atenção, me explica as coisas da Bíblia. Lá no culto tem muita gente que presta atenção na gente, acolhe bem todo mundo. Assim eu procuro ser fiel e grata a Deus, mas só uma coisa eu não posso deixar: Nossa Senhora e os meus santos. Sem eles fico muito sozinha!”. Isso mostra que a construção social dos santos ultrapassa os limites de uma confissão religiosa. Parecem muito mais parceiros (invisíveis) do povo em sua jornada cotidiana. Uma amiga diz de Santa Teresinha: “Nós somos colegas!”. Ou ainda: “Já vi que o senhor e Santo Antônio são colegas!”.

Será que assim, ao recorrer aos santos, não estamos deixando Jesus em segundo plano? Ao buscar tantos intercessores, não estamos apontando certa distancia de Deus? Nos escritos do primeiro testamento bíblico, o termo santo corresponde ao hebraico qadosh (citado mais de 100 vezes), que significa separado. Os essênios, monges de estrita observância, que viviam próximo do Mar Morto, com os quais João Batista teve certa proximidade, são exemplos típicos deste modelo: separavam-se do mundo para se manter puros na espera do Messias. Já no segundo testamento, o correspondente do mesmo tempo em grego é ágios (citado mais de 200 vezes), que quer dizer separado por Deus para si. Daí na Igreja primitiva os santos são referidos como todos os crentes (cf. 1Pd2,9; At 9,13.32;26,10; Rm 8,27;12,13;15,25.26;Ef 4,11). As comunidades primitivas marcadas pela perseguição, testemunhando o martirio de diversos irmãos, reuniam-se nas catacumbas dos mártires Pascal de Jesus, a páscoa dos que por amor a Ele tiveram suas vidas sacrificadas.

Mediação – São Paulo na Carta aos Romanos recorda que Jesus está à direita de Deus intercedendo por nós (cf. Rm 8, 34). E com Timóteo, tratando da oração, diz que existe só um Deus e um único mediador – Jesus Cristo (cf. 1Tm 2,5). De forma alguma se pode relegar Jesus a um segundo plano, até porque por meio dele tudo foi feito (cf. Jo 1). Porem, há certa diferença entre a mediação, um caminho necessário pelo qual é preciso passar para se chegar até Deus, e a intercessão, uma efetiva configuração da oração comunitária. E como a Igreja é constituída por uma parte visível e outra invisível, trata-se, portanto, da comunhão eclesial entre todos os filhos de Deus, militantes e triunfantes. Juntos oramos ao Pai, uns pelos outros, os que aqui estamos e os que já se foram para mais próximo dele, confiantes de que o bem de um membro dispõe em favor dos outros, visto que formamos um único corpo tendo Cristo Jesus no comando.

Do ponto de vista da espiritualidade cristã e da teologia, o elemento essencial na caminhada de fé do povo de Deus, o qual não se pode perder de vista, é a centralidade de Jesus Cristo. Quaisquer formas de intercessão, cuja intercessão for poder exclusivo daquele que é invocado, sem aludir a Jesus, são irrelevantes à nossa fé. Se observarmos bem, mesmo quando contemplamos os mistérios do rosário, entre a recitação das saudações do anjo e de Isabel e a Santa Maria, é sempre proclamado o nome de Jesus. Contemplando os mistérios, somos conduzidos a invocar sobre nós a poderosa proteção do santo nome do Senhor. Desse modo, não colocamos Jesus em segundo plano, mas, ao contrario, só é possível viver a comunhão dos santos, só se pode praticar a oração comunitária da intercessão, imbuídos do Espírito de Jesus, voltados para Ele, progredindo numa amorosidade cristocêntrica. Pois temos presente como consciência disponível “que tudo concorre para o bem dos que amam a Deus, dos chamados segundo seu desígnio” (Rm 8,28).

(Pe. Antônio de Lisboa – Família Cristã 2004)

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