"Ó Deus, criaste-nos para Ti e o nosso coração vive inquieto enquanto não repousa em Ti!" (Santo Agostinho)

"Faça poucas coisas, mas as faça bem!" (São Francisco de Assis)

terça-feira, 7 de junho de 2011

Gozar a vida


A religião nos impedirá de gozar a vida?

Carta do "Quarto Mosqueteiro" ao Pe. Marcel (Livro: Clínica do Coração)

Confesso francamente que a religião me parece às vezes bem enfadonha! Ela nos impede de gozar a vida. Suas leis nos proíbem isto e aquilo, e é um nunca acabar de proibições...
Penso que um bom católico só pode levar uma vida triste... Será que eu não tenho razão?

O Quarto Mosqueteiro


Não , HESITO, meu senhor, em declarar-lhe que não.
E que acabará concordando comigo, se tiver a paciência de acompanhar-me até o fim.

Há dois modos de encarar as leis morais que nos são impostas por Deus. A primeira - que infelizmente é a sua - é considerá-las como entraves, fontes de aborrecimento. Então, já não se sente nenhum escrúpulo em infringi-las. Sente-se até um prazer em contorná-las habilmente. Quer um exemplo?

Um dia eu procurava um lugar para estacionar o meu carro. Nenhum, absolutamente nenhum! O único lugar livre estava justamente debaixo de uma tabuleta onde se lia em letras gigantescas: "ESTACIONAMENTO PROIBIDO". Em desespero de causa, coloquei o carro em lugar proibido e fui cuidar dos meus compromissos. Quando voltei, esperava-me um policial com a cara mais rebarbativa do mundo: "Padre, o senhor está multado". A falta era flagrante. Impossível protestar. Perguntei então: "Quanto é?" O policial desfez a cara e me disse sorrindo: "Dois santinhos! Meus filhos são loucos por santinhos! O senhor deve ter algum em seu livro." Por sorte eu tinha dois e bem bonitos. O policial e eu enfrentávamos a lei com toda tranquilidade. Por quê? Porque víamos na lei do estacionamento uma determinação abstrata, emanada por uma autoridade anônima e longínqua. Para nós, a lei era uma "coisa" e uma coisa aborrecida.

Voltemos às leis de Deus. Pois tudo muda quando as encaramos do segundo modo, do modo certo, como expressão da vontade de alguém que nos ama e quer o nossos bem. Vou dar um novo exemplo.

No nosso convento, situado num subúrbio, não recebíamos água do reservatório da cidade, mas de um poço cavado ao lado da casa. Um dia, um de nossos amigos, que era médico e higienista, veio visitar-nos e tendo bebido da água. suspeitou que estivesse contaminada, o que foi confirmado pelo exame. Condenou o nosso poço até segunda ordem e tabuleta, aqui e ali, advertiam: "É PROIBIDO BEBER DESTA ÁGUA". Uma tarde, quando estava com muita sede, tive que decidir entre beber imediatamente da água do poço, ou esperar meia hora pela água engarrafada. Resolvi esperar.

Reparou a diferença entre a minha negligência em observar a advertência do proibido estacionar e do proibido beber a água poluída? Simplesmente: aos meus olhos a lei do estacionamento vinha de uma autoridade longínqua, ao contrário, a advertência da água, de um amigo conhecido e digno de confiança.

Apliquemos estes princípios à lei de Deus.

Não há a mínima dúvida, caro senhor mosqueteiro, que verá nas leis divinas aborrecimentos prejudiciais, se pensar em Deus como numa abstração anônima, alguma coisa de perdido nas nuvens... Mas tudo mudará, tudo ficará ensolarado, se passar a ver em Deus um amigo, um pai, alguém que quer a sua felicidade neste mundo e sobretudo no outro. Então, sua religião não mais lhe parecerá aborrecida. E o você a praticará com gratidão e alegria.


Pe. Marcel - Marie Desmarais - Dom Marcos Barbosa (Clínica do Coração)

(1993)



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